Capa de O País das Mulheres - Gioconda Belli

Nicarágua: O País das Mulheres

Resenha nº 14: O País das Mulheres – Gioconda Belli

A resenha de hoje é sobre o representante nicaraguense do desafio: O País das Mulheres, escrito por Gioconda Belli. Eu adorei o livro, apesar de haver críticas a se fazer sobre ele.

Embora a obra aborde o aspecto político de Fáguas, um país fictício da América Central, me parece que o verdadeiro objetivo da autora é pedir que as pessoas não desistam de seus sonhos, pois eles podem produzir mudanças no mundo. Resumindo: aproveite sempre as oportunidades que o mundo lhe dá e use a criatividade.

A história tem início quando Viviana Sansón se cansa de apenas narrar as injustiças de seu país e deseja fazer a diferença nele. Viviana é uma apresentadora de TV e jornalista que ganhou o carinho do público por suas matérias ousadas e inflamadas que expunham a corrupção absurda do governo de Fáguas. Para atingir o seu objetivo, ela e suas amigas leais – Juana de Arco, Eva Salvatierra, Martina Meléndez, Rebeca de los Ríos e Ifigenia Porta – fundaram o PEE (Partido da Esquerda Erótica). O nome é uma paródia do livro Poemas de la Izquierda Erótica, da escritora guatemalteca Ana María Rodas, e tem o objetivo de escandalizar, embora escrevam em seu manifesto:

Somos de esquerda porque acreditamos que um gancho de esquerda no queixo é o que merecem a pobreza, a corrupção e o desastre deste país. Somos eróticas porque Eros significa VIDA, que é o mais importante que temos, e porque nós, mulheres, não apenas estivemos desde sempre encarregadas de gerá-la, mas também de mantê-la e protegê-la. […] Prometemos limpar este país, varrê-lo, esfregá-lo, sacudi-lo e lavar o lodo até que brilhe em todo o seu esplendor. Prometemos deixá-lo reluzente e com cheiro de roupa passada.

As fundadoras propunham uma estratégia que não era o feminismo com o qual estamos habituados, embora nitidamente defendesse os interesses das mulheres em suas propostas. Elas abraçaram todos os esteriótipos relacionados ao sexo feminino e os transformaram em qualidades, ou seja, lutaram para retirar o peso negativo de tais características, que teoricamente não as recomendariam para cargos importantes de comando.

Com um pouco de sorte do destino, o vulcão do país entrou em atividade e sua fumaça continha algum componente que baixou o nível de testosterona na população masculina, o que facilitou ainda mais o trabalho eleitoral do PEE, baseado em mutirões para pintar as unhas do pés e outras atividades consideradas tipicamente femininas. Com esta campanha regada de bom-humor, elas ganharam as eleições.

Entretanto, mais do que falar de política (de um jeito bastante amador), a obra fala do ser humano. Afinal, quem são essas mulheres? Conhecemos um pouco mais de suas histórias do ponto de vista de Viviana. A presidente promoveu diversas reformas controversas, o que deixou muitos homens descontentes, assim como a oposição, que estava inconformada.

Viviana gostava de manter o contato com o povo e colocava sua segurança em risco frequentemente em discursos abertos ao público. Contudo, devido a uma falha de segurança durante uma queima de fogos de artifício, Viviana foi alvejada por um atirador anônimo. Milagrosamente, ela sobrevive mas fica em coma.

Durante o coma, Viviana viu-se em uma sala branca com diversos objetos dispersos em prateleiras. Ela reconheceu coisas que perdera no passado. Quando os tocava, lembranças vinham vividamente, como se ela estivesse revivendo aqueles momentos: o amor que sentia por seu primeiro marido, as situações do dia a dia que a indignavam, pedidos de socorro, a trajetória eleitoral, dentre muitas outras.

No poder, o PEE impôs (com uma facilidade suspeita), um novo modo de vida para os cidadãos de Fáguas, que combatia diretamente os abusos sexuais e a exploração feminina. O governo feminino transformou o país em uma potência na produção de flores e créditos de carbono, criou escolas livres para crianças até 12 anos em seus bairros, creches e — para os bairros que fossem mantidos limpos — acesso gratuito à água potável.

Por outro lado, o governo também tomou atitudes polêmicas. Quando se deu conta do desconforto das funcionárias mulheres na presença de homens, que já tinham experiência de governo, Viviana decidiu demitir todos os homens por 6 meses. Contratou mulheres para preencher os empregos vagos, com sucesso. Além disso, obrigou os homens a ficar em casa e realizar trabalho doméstico e criou um reality show no qual os inscritos eram filmados trabalhando em casa. Para punir os estupradores, exibiam-nos em jaulas nos espaços públicos, para que pudessem sofrer do constrangimento a que submeteram as mulheres que foram atacadas, além de um “E” tatuado na testa para identificação após serem libertados.

Eis a pergunta: onde estava a oposição neste tempo todo? A liberdade da presidente era muito grande, ela fazia praticamente tudo o que desejava. Acredito que a autora tenha pecado neste aspecto, em não explorar as relações políticas. Seus planos sofreram pouca contrariedade.

No caso dos estupradores, apesar de a autora ter mostrado a indignação de homens e da imprensa internacional a respeito desta atitude (assim como sobre a demissão de todos os homens do governo), ela não parece ter se posicionado. O fato é que existem impedimentos éticos, além de se supor que os tribunais sejam infalíveis e, em alguns casos, comportamentos sexuais aberrantes são casos clínicos, ou seja, o estuprador na verdade sofre de alguma doença tratável e portanto não deveria ser exposto ao ridículo, e sim encaminhado ao hospital.

As reformas parecem ter funcionado absurdamente bem, sem grandes dificuldades aparentes. Sem contar na questão financeira, balanceada facilmente com flores, oxigênio (dos créditos de carbono) e empréstimos feitos sem preocupação, o que era muito criticado pelos homens quando ainda faziam parte do governo. A popularidade de Viviana era assombrosa, o que lhe dava carta branca para praticamente tudo.

O fato é que o que aquele grupo de amigas, mulheres loucas, que fundaram o PEE lutaram por um sonho e fizeram acontecer. Acredito que esta seja a grande mensagem do livro, porque apesar de boas reformas propostas, no geral essa não é uma boa maneira de se governar um país.

Além do mais, parece que o caso de Fáguas é muito mais dramático que o brasileiro em relação ao machismo. As mulheres brasileiras não são socialmente obrigadas a ficar em casa após ter filhos, tendo diploma universitário ou não. O livro também aborda a necessidade de emancipação feminina em questões muito básicas, como a submissão ao marido e o direito ao trabalho. Enfim, este é um livro bastante polêmico. Compartilhe nos comentários suas impressões sobre ele, vou adorar discutir sobre isso.


Ficha Técnica:

Autor:  Gioconda Belli

Editora: Verus

Edição: 1

Ano: 2011

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